Ana Paula Martins, a polémica ministra que tem África no sangue

Nasceu em Bissau, onde tomou banho à chuva. Filha de farmacêuticos, seguiu a tradição familiar. Denunciou o caso das gémeas e é uma das ministras mais visadas do Governo de Luís Montenegro.

Guerras com administradores hospitalares, um plano de remodelação do Serviço de Nacional de Saúde contestado, até um acidente de automóvel que obrigou a internamento. Em apenas três meses, Ana Paula Martins, ministra da Saúde, colecionou polémicas atrás de polémicas.

Nascida em Bissau, na então Guiné portuguesa, onde viveu até aos sete anos, diz guardar gratas recordações desse período “feliz”. Em África, o pai geriu uma farmácia, dirigiu um laboratório de medicamentos e foi professor de Química. A mãe, também farmacêutica, dedicou-se ao Ensino Primário. “Almoçava-se em casa, dormia-se a sesta, tomava-se banho à chuva. Stress era uma palavra desconhecida. Havia muita liberdade e tudo isto marcou a minha infância”, recordou Ana Paula Martins, em entrevista à revista “Forbes”. Filha única, apenas com irmãos de um primeiro matrimónio do pai, foi aluna na escola onde a mãe dava aulas. E ouvia queixas dos colegas por ela castigados.

A família deixou África tinha Ana Paula Martins sete anos. O choque com a nova realidade em Lisboa impressionou-a. “O contexto do regresso foi difícil”, admitiu na mesma entrevista, na qual recordou outro episódio que nessa altura a marcou: a perda repentina do pai poucos meses depois da chegada à capital. “As pessoas que nascem em África têm outra apetência para o risco e enfrentam as situações”, assinalou.

Seguindo a tradição familiar, licenciou-se em Ciências Farmacêuticas pela Universidade de Lisboa, em 1990. Cinco anos depois, passou com distinção o mestrado em Epidemiologia, na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova. O doutoramento chegou apenas em 2005, na Faculdade de Farmácia, onde iniciara o percurso no Ensino Superior e também foi professora auxiliar durante cerca de duas décadas.

Com dois filhos, Catarina e Ricardo, Ana Paula Martins é casada com o vice-almirante Alberto Silvestre Correia, que frequentemente atua em posições de comando em operações navais levadas a cabo pela NATO.

Admiradora de Winston Churchill, cita frequentemente uma das mais famosas frases atribuídas ao estadista britânico: “A coragem é a maior das virtudes, todas as outras dependem dela”. Já militante do PSD, a primeira experiência num Governo ocorreu quando foi adjunta do ministro Couto dos Santos, entre 1992 e 1993, nos Assuntos Parlamentares, acompanhando-o depois no Ministério da Educação, entre 1993 e 1994, anos de grandes manifestações de repúdio contra a Prova Geral de Acesso (PGA) e o aumento das propinas.

Bastonária da Ordem dos Farmacêuticos entre 2016 e 2022, foi como presidente do Conselho de Administração do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, que se destacou ao trazer para a praça pública o polémico caso das gémeas, Maitê e Lorena, que alegadamente envolve um filho do presidente da República, o próprio Marcelo Rebelo de Sousa e Lacerda Sales, ex-secretário de Estado da Saúde, e cujos contornos estão agora a ser apurados em sede de Comissão de Inquérito, na Assembleia da República, e pelo Ministério Público.

Ana Paula Martins ordenou a realização de uma investigação interna no Santa Maria, que haveria de levantar suspeitas sobre a existência de favorecimento para acelerar o processo de tratamento das meninas luso-brasileiras, nomeadamente no acesso rápido ao Zolgensma, um dos medicamentos mais caros do Mundo, destinado a tratar problemas de atrofia muscular e avaliado em dois milhões de euros.

Abandonou o maior hospital de Lisboa em conflito com os médicos de ginecologia e de obstetrícia, acabando por ser nomeada ministra da Saúde já depois de ter passado por uma das vice-presidências do PSD, na liderança de Rui Rio. “Teve pouca participação naquilo que era então a linha política do partido”, recorda um ex-dirigente social-democrata, seu contemporâneo de direção.

Em 2019, ainda o Governo era liderado pelo socialista António Costa, o Ministério da Saúde galardoou-a com a Medalha de Serviços Distintos – Grau Ouro. Cinco anos depois, lidera o mesmo ministério a quem apontou falhas e que vive rodeado de casos mediáticos.

Cargo: Ministra da Saúde
Nascimento: 04/11/1965 (58 anos)
Nacionalidade: Portuguesa (Bissau, Guiné-Bissau)