O que está em causa na polémica com Aguiar-Branco

José Pedro Aguiar-Branco, presidente da Assembleia da República

A Constituição consagra a liberdade de expressão, mas também o direito à não-discriminação, os deputados gozam de imunidade parlamentar, mas o presidente da Assembleia da República (PAR) pode advertir ou mesmo retirar a palavra. No meio disto, há opiniões opostas e acusações várias, que vão do ambiente censório à banalização do discurso racista.

O rastilho
“Os turcos não são propriamente conhecidos por ser o povo mais trabalhador do Mundo”
André Ventura
Presidente do Chega, proferiu a frase acima na Assembleia da República (AR), durante uma discussão sobre a construção do novo aeroporto

O diálogo
A tirada de Ventura motivou um burburinho nas bancadas, que levou José Pedro Aguiar-Branco, PAR, a fazer um reparo: “O senhor deputado tem liberdade de expressão para se exprimir e o julgamento do discurso político não é meu nem de nenhum deputado”. Alexandra Leitão, líder parlamentar do PS, interpelou então o PAR: “Se uma determinada bancada disser que uma determinada raça ou etnia é mais burra, mais preguiçosa ou menos digna, também pode?” A resposta de Aguiar-Branco inflamou o espaço público: “No meu entender, pode”.

A cisão
A discussão que se seguiu assentou numa cisão relativamente comum: a Esquerda apontou o dedo ao precedente que se estava a abrir, com a banalização do discurso de ódio – no caso racista e xenófobo – , a Direita defendeu, na sua generalidade, a intervenção de Aguiar-Branco, invocando a liberdade de expressão como valor supremo. Houve até quem falasse num “ambiente censório”.

Liberdade vs. ódio
A liberdade de expressão está consagrada no artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). No entanto, a Constituição também estabelece a “proteção legal contra quaisquer formas de discriminação”. E o crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência está previsto no artigo 240.º do Código de Processo Penal.

Imunidade vs. advertência
Há dois outros pontos relevantes. De acordo com a CRP (artigo 157.º), os deputados gozam de imunidade parlamentar, ou seja, “não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções”. Já o Regimento da Assembleia (AR) estipula que “o orador é advertido pelo PAR quando (…) o discurso se torne injurioso ou ofensivo”, podendo mesmo ser-lhe retirada a palavra. As críticas a Aguiar-Branco incidem sobretudo no facto de não ter feito qualquer advertência.